20 de fevereiro de 2014

Ela

Amor real?

Her, Dir: Spike Jonze, EUA, 2013, 126 min
IMDB: clique aqui


Mais um concorrente ao Oscar 2014, Ela se passa em um futuro próximo, no qual a no qual o sistema operacional dos smartphones, mais do que simplesmente obedecer comandos por voz, passa a interagir com seus usuários, conversando como se fosse uma pessoa normal, o que inclui contar piadas, ter voz ofegante, querer saber fofocas, dentre outros atributos humanos. 

O protagonista Theodore (Joaquin Phoenix) é um solitário escritor de cartas pessoais que está em processo de divórcio e adquire o novo sistema operacional OS¹ (clara referência ao iOS dos iPhones). Em seu contato inicial com o sistema (na voz de Scarlett Johanson, que merecia estar concorrendo ao Oscar pela vida que injeta na personagem virtual), este pergunta seu nome e ela diz que é Samantha, pois o escolheu entre todos os milhares de nomes possíveis em milésimos de segundo, demonstrando desde logo a assimetria que existirá entre eles quanto ao tempo de aprendizado.

O filme passa a abordar então a maneira como Theodore se relaciona com Samantha, numa metáfora sobre como é que nos relacionarmos uns com os outros. 

Quando eu conto a sinopse do filme, ou seja, um cara que se apaixona pelo sistema operacional, as pessoas riem em tom de deboche e estranhamento. Mas, curiosamente, o filme transforma essa estranha relação em algo bastante concreto em poucos minutos. Afinal, o que são os nosso relacionamentos reais? Amamos o que, afinal? O corpo da pessoa ou sua personalidade? Se é uma questão de personalidade, Samantha não fica devendo nada a ninguém, dada sua capacidade de interagir, evoluir e se adaptar.

Com base nesse relacionamento, o filme vai colocar situações sobre como nos portaríamos frente a esta possibilidade de sermos amigos de nossos computadores. Na estória, em pouco tempo, torna-se muito comum e socialmente aceitável que as pessoas namorem seus sistemas operacionais. Mas persiste o problema de que a relação se dá com um ente incorpóreo, que não compartilha de nossa limitação física de somente poder estar em um local em dado momento, assim como não tem nossa única certeza, de que iremos morrer.

O tema não é fácil de ser trabalhado, poderia facilmente cair num estranhamento de apresentar o protagonista como um doido varrido ou, por outro lado, ir pro sentimentalismo de mostrar uma linda estória de amor entre Theodore e Samantha. Mas o diretor e roteirista Spike Jonze (da comédia cult e maluca Quero Ser John Malkovich) conduz sua obra de maneira magistral, mostrando, enfim, a miséria humana em sua busca por afeto.

Aproveito para traçar um paralelo entre este filme e outro sensacional sobre como se dão nossos relacionamentos em meio a revolução digital, que é Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Virtual. Aos que gostarem de Ela, recomendo este, mais adaptado ao nosso presente e a realidade de metrópoles caóticas.

Ela se insere no renascimento do gênero da ficção científica. Digo renascimento porque a revolução digital foi mais surpreendente do que a ficção, fazendo com que poucos se aventurassem, entre 1990 e 2010, a imaginar o futuro.

Agora, que temos mais claro para onde tal revolução caminha, surgem filmes como Ela e o novo Robocop, nos quais o temor anterior de que os computadores tornariam-se inteligentes e iriam nos matar, como em 2001 - Uma Odisséia no Espaço ou O Exterminador do Futuro, cede lugar a um casamento já consolidado entre seres humanos e máquinas e aos limites éticos nessa relação quase simbiótica.

Finalizando, deixo novamente o link de uma coluna de Contardo Calligaris abordando o assunto do relacionamento com uma máquina: Amor de Máquina.

Nota: 9

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