7 de fevereiro de 2020

Oscar 2020 - Apostas e Escolhidos

And the Oscar Goes to...


Após 2 anos de inatividade, uma edição especial do Pitacos com as análises do Oscar 2020 nas categorias dos longas metragens de ficção, exceto a dos filmes estrangeiros. 


Melhor Filme

Vencedor: 1917
Meu voto: Coringa

1917 é uma aula de cinema! Merece o prêmio, ao contrário de filmes meia boca que venceram nos últimos dois anos (A Forma da Água e Green Book). Mas Coringa, apesar de ambientado 40 anos atrás, traz uma forte crítica ao desgaste do tecido social que reflete na atualidade e mostra as consequências da marginalização de uma parte considerável da sociedade. 
Segue a minha lista de ordem de preferência:

  1. Coringa
  2. Parasita
  3. 1917
  4. História de um Casamento
  5. Jojo Rabbit
  6. Adoráveis Mulheres
  7. O Irlandês
  8. Era uma Vez... Em Hollywood
  9. Ford vs Ferrari

Melhor Direção

Vencedor: 1917 
Meu voto: Idem
Uma direção que salta aos olhos. Merece o prêmio.

Melhor Atriz

Vencedor: Renée Zellweger
Meu voto: sem voto

Somente vi a atuação de Scarlett Johansson e não sou capaz de opinar!

Melhor Ator

Vencedor: Joaquin Phoenix
Meu voto: Idem

O cara pegou um papel que Heath Ledger tornou icônico e conseguiu criar outroi ícone de forma diferente. Phoenix já tinha um currículo de respeito e ganhará o prêmio por sua melhor atuação.


Melhor Ator Coadjuvante

Vencedor: Brad Pitt
Meu voto: idem
Sempre tem aquela discussão se o cara era coadjuvante ou protagonista, como aqui. Já que o estúdio indicou e ele fez um ótimo trabalho como um cara caladão mas bem expressivo, merece o prêmio.


Melhor Atriz Coadjuvante

Vencedora: Laura Dern
Meu voto: Idem
Dern encarna aqui a advogada de família ao mesmo tempo amiga e escrota de maneira brilhante.


Melhor Roteiro Original

Vencedor: Parasita
Meu voto: idem
Uma crítica social pesadíssima feita de forma absurdamente inteligente, irônica e com reviravoltas inesperadas.


Melhor Roteiro Adaptado

Vencedor: Jojo Rabbit
Meu voto: Dois Papas

Jojo é um bom filme, muito divertido e sensível nos momentos certos. Mas Dois Papas, sendo um filme focado num debate, conseguiu tirar mais de menos. Aliás, o filme deveria concorrer na categoria principal no lugar de Ford vs Ferrari.


Melhor Fotografia

Vencedor: 1917 - Roger Deakins
Meu voto: idem
O mestre Deakins demorou pra vencer sua primeira estatueta com Blade Runner 2049 e agora levará com absoluta facilidade a segunda após o trabalho fenomenal em 1917.


Melhor Figurino

Vencedor: Adoráveis Mulheres
Meu voto: idem

Filmes de época costumam brilhas nessa categoria e não será diferente agora.

Melhor Maquiagem

Vencedor: Escândalo

Meu voto: Coringa

A nova maquiagem do palhaço já se tornou tão icônica quanto às anteriores. Certamente será hit de Carnaval no Brasil.



Melhor Mixagem de Som

Vencedor: 1917
Meu voto: idem

Para a imersão proposta no filme, o som é um elemento fundamental e foi muito bem mixado e editado. O único concorrente de peso nessa e na categoria seguinte é Ford vs Ferrari, com méritos por criar sons de carros de corrida.


Melhor Edição de Som

Vencedor: 1917
Meu voto: idem
Mesmo comentário anterior.


Melhores Efeitos Visuais

Vencedor: 1917

Meu voto: idem

E na categoria em que concorrem só os blockbusters lotados de raios, espaçonaves e explosões vai ganhar um filme em que os efeitos visuais são tão, mas tão reais, que a gente até acha que aconteceram de verdade.


Melhor Design de Produção

Vencedor: Era uma Vez... Em Hollywood
Meu voto: 1917

A Academia não vai resistir à tentação de premiar o autoelogio de seu passado glamuroso. Mas o cenário que faz com que quase sintamos o cheiro podre das imundas trincheiras da Primeira Guerra merecia levar.


Melhor Montagem

Vencedor: Parasita
Meu voto: idem

Filme com um ritmo perfeito para a história contada. O único que pode desbancá-lo é Ford vs Ferrari.


Melhor Trilha Sonora Original

Vencedor: Coringa
Meu voto: 1917

A trilha sonora ajuda nas várias danças do palhaço e será contemplada.


Melhor Canção Original

Vencedor: I´m Gonna Love me Again - Elton John
Meu voto: idem

Sir Elton John criou uma nova canção pra sua cinebiografia e sairá com o prêmio.


Aposta feitas, agora é aguardar a cerimônia. Quem quiser acompanhar ao vivo, devo dar alguns pitacos no Twitter.

2 de março de 2018

Oscar 2018: Indicados do Pitacos

Os Esnobados de 2018


E vamos a mais uma edição dos Esnobados. Nesse ano até que não tem tantas mudanças, exceto para filme. Apesar de nenhum dos indicados nessa categoria ser ruim, há outras produções superiores.

Infelizmente não vi todos os filmes indicados em todas as categorias de longas. Mas acho que posso dar uns pitacos com base no que vi. Algumas categorias deixei intactas. 

Três filmes que se incluí em diversas categorias são os mesmo que incluí na de melhor filme, que foram bem esnobados.

Vamos à lista:


Melhor Filme

  • Me Chame Pelo Seu Nome
  • Dunkirk
  • Corra!
  • Trama Fantasma
  • The Post - A Guerra Secreta
  • Três Anúncios Para um Crime
  • O Destino de Uma Nação
  • Lady Bird - A Hora de Voar
  • A Forma da Água
  • O Estranho que Nós Amamos
  • Blade Runner 2049
  • Mãe!
Sim, vou tirar até mesmo um dos favoritos ao Oscar A Forma da Água. Achei esses eliminados apenas ok. Os incluídos tem muito maior valor artístico, ainda que Mãe! seja um filme bem desagradável, mas essa era a proposta do diretor.

Melhor Direção


  • Dunkirk - Christopher Nolan
  • Corra! - Jordan Peele
  • Trama Fantasma - Paul Thomas Anderson
  • A Forma da Água - Guillermo del Toro
  • Lady Bird - A Hora de Voar - Greta Gerwig
  • Blade Runner 2049 - Denis Villeneuve
  • O Estranho que Nós Amamos - Sofia Coppola
Tirei uma mulher da lista, mas incluí outra. Acho que Sofia Coppola só não está no páreo por já ter vencido o Festival de Cannes. Seu trabalho é muito superior ao de Gerwig. E ainda ficou de fora a única mulher que já ganhou um Oscar de direção, Kathryn Bigelow, que fez um belo trabalho em Detroit em Rebelião.

Melhor Atriz


  • Sally Hawkins - A Forma da Água
  • Frances McDormand - Três Anúncios Para um Crime
  • Margot Robbie - I, Tonya
  • Saoirse Ronan - Lady Bird - A Hora de Voar
  • Meryl Streep - The Post - A Guerra Secreta
  • Nicole Kidman - O Estranho que nós Amamos
Streep é fantástica, mas não fez um trabalho digno de premiação. Kidman fez um trabalho melhor do que o do ano passado em que foi indicada por Lion.

Melhor Ator


  • Timotheé Chalamet - Me Chame Pelo Seu Nome
  • Daniel Day Lewis - Trama Fantasma
  • Daniel Kaluuya - Corra!
  • Gary Oldman - O Destino de Uma Nação
  • Denzel Washington - Roman J. Israel, Esq.
  • James McAvoy - Fragmentado
Denzel Washington é o destaque do filme e faz um bom trabalho, mas McAvoy teve que se desdobrar para fazer bem uns 10 papéis no filme.


Melhor Ator Coadjuvante


  • Willem Dafoe - Projeto Flórida
  • Richard Jenkins - A Forma da Água
  • Christopher Plummer - Todo o Dinheiro do Mundo
  • Sam Rockwell - Três Anúncios Para um Crime
  • Woody Harrelson - Três Anúncios Para um Crime
  • Colin Farrell - O Estranho que Nós Amamos
    Harrelson dá humanidade a Três Anúncios, mas Farrell contribui muito mais para O Estranho que nós Amamos.


    Melhor Atriz Coadjuvante


    • Mary J. Blige - Mudbound – Lágrimas sobre o Mississipi
    • Allison Janney - I, Tonya
    • Laurie Metcalf - Lady Bird - A Hora de Voar
    • Lesley Manville - Trama Fantasma
    • Octavia Spencer - A Forma da Água
    • Vicky Krieps - Trama Fantasma
    Octavia Spencer sempre faz o mesmo papel da mulher do povo esperta e faladora, já ganhou até um Oscar imerecido por isso. Vicky Krieps não se intimidou em contracenar com a lenda Daniel Day-Lewis. Kirsten Dunst também está ótima em O Estranho que Nós Amamos.


    Melhor Roteiro Original

    • Corra!
    • A Forma da Água
    • Três Anúncios Para um Crime
    • Lady Bird - A Hora de Voar
    • Doentes de Amor
    • Mãe!
    Doentes de Amor é um filme que não se decide se é drama exagerado ou uma comédia sem graça. De qualquer jeito, é ruim. Mãe! é de embrulhar o estômago, mas é genial.


    Melhor Roteiro Adaptado

    • Artista do Desastre
    • Me Chame Pelo Seu Nome
    • A Grande Jogada
    • Mudbound
    • Logan
    • Blade Runner 2049
    Infelizmente somente vi Logan dentre os indicados que é bom. Mas Blade Runner 2049 é melhor e assume seu lugar.


    Melhor Fotografia

    • Blade Runner 2049 - Roger Deakins
    • Mudbound - Rachel Morrison
    • Dunkirk - Hoyte van Hoytema
    • A Forma da Água - Dan Laustsen
    • O Destino de Uma Nação - Bruno Delbonnel
    • Star Wars - Os Últimos Jedi
    Os Últimos Jedi tem uma série de defeitos, mas sua fotografia é ótima, muito superior à repetitiva de O Destino de Uma Nação.


    Melhor Figurino

    • A Bela e a Fera
    • O Destino de Uma Nação
    • Trama Fantasma
    • A Forma da Água
    • Victoria e Abdul 


    Melhor Maquiagem e Cabelo

    • O Destino de Uma Nação
    • Extraordinário
    • Victoria e Abdul

    Melhor Mixagem de Som

    • Em Ritmo de Fuga
    • Blade Runner 2049
    • Dunkirk
    • A Forma da Água
    • Star Wars - Os Últimos Jedi

    Melhor Edição de Som

    • Em Ritmo de Fuga
    • Blade Runner 2049
    • Dunkirk
    • A Forma da Água
    • Star Wars - Os Últimos Jedi

    Melhores Efeitos Visuais

    • Blade Runner 2049
    • Guardiões da Galáxia Vol.2
    • Kong - A Ilha da Caveira
    • Star Wars - Os Últimos Jedi
    • Planeta dos Macacos - A Guerra

    Melhor Design de Produção

    • A Bela e a Fera
    • Blade Runner 2049
    • O Destino de Uma Nação
    • Dunkirk
    • A Forma da Água

    Melhor Montagem

    • Em Ritmo de Fuga
    • Dunkirk
    • Eu, Tonya
    • A Forma da Água
    • Três Anúncios Para um Crime

    Melhor Trilha Sonora Original

    • Dunkirk - Hans Zimmer
    • Trama Fantasma - Jonny Greenwood
    • A Forma da Água - Alexandre Desplat
    • Star Wars - Os Últimos Jedi - John Williams
    • Três Anúncios Para um Crime - Carter Burwell

    The Post

    O Quarto Poder

    Dir: Steven Spielberg, EUA, 2017, 1h56min
    IMDB                 Trailer


    Qual o papel da imprensa na sociedade contemporânea? Essa talvez seja a principal questão que Steven Spielberg queira responder em The Post.

    Na trama passada em 1971, a dona do The Washington Post fica no dilema entre publicar arquivos secretos sobre o fracasso da Guerra do Vietnã que a justiça já havia proibido o concorrente The New York Times de divulgar, mantendo a credibilidade de seu veículo, ou se calar, evitando a possível falência da empresa e um mal estar com seus amigos políticos de longa data. 

    O filme foi feito para engrandecer os jornalistas, mostrados como uma classe de pessoas sempre em busca de mostrar à sociedade o mal que o governo pode causar. Há, inclusive, muitos termos do setor, como "lide" e "foca", que talvez os não habituados ao jargão das redações tenham um pouco de dificuldade em compreender.

    O papel da imprensa na informação aos governados, tão questionado sobretudo após a vitória política de Donald Trump, é bem analisado na trama. O vilão principal aqui é Richard Nixon, mas  a culpa sobra também para todos os presidentes anteriores a ele envolvidos na Guerra do Vietnã: Eisenhower, Kennedy e Johnson. Todos mentiram ao público sobre as chances dos EUA vencerem a guerra.

    Há um embate muito forte no filme entre o dinheiro e o interesse público. De um lado estão os jornalistas, que querem mostrar tudo, doa a quem doer. Do outro a editora do jornal, que sabe que se o jornal desagradar muita gente pode perder anunciantes e leitores e não ter mais saúde financeira para seguir produzindo material de qualidade, perdendo o próprio sentido da existência.

    Spielberg não resiste a seu habitual sentimentalismo e passa um pouco do ponto na análise do drama da protagonista, uma milionária que tem que lutar pelo legado da empresa de sua família. Até mesmo outros personagens mostrados como pessoas comuns se compadecem desse drama emocional. Felizmente os exageros de pieguice aqui estão contidos, ao contrário de seu último filme "adulto", Ponte dos Espiões.

    Há também algumas pitadas de discussão sobre a inserção feminina no mundo empresarial bem inseridas. Não é um tratado sobre o tema, mas é bem contextualizado, mostrando que se ainda hoje as mulheres vivem desafios no mundo corporativo, há quase 50 anos atrás elas eram vistas como alienígenas.

    No elenco os dois maiores pesos pesados de Hollywood, Meryl Streep e Tom Hanks. Streep, como sempre, é competente, mas sua atuação não era digna de premiação dessa vez. No entanto, ela tem lugar cativo nas indicações, sendo essa a sétima nos últimos 10 anos. Hanks aqui deixou seu papel habitual de bom moço para interpretar um anti-herói e se saiu mal. Seu personagem é o estereótipo do diretor de redação durão e mal humorado. Para compô-lo, ele se vale de uma voz áspera extremamente caricatural que só prejudica sua atuação. Ainda assim, não chega a prejudicar o filme.

    Tecnicamente, como é padrão nos filmes de Spielberg, o filme é bem realizado, com a bela fotografia de seu parceiro de longa data Janusz Kaminski. Merecem destaque as sequências que mostram a parte técnica da produção de um jornal antes da era digital.

    Na corrida do Oscar o filme recebeu indicação para atriz principal e melhor filme. Não vai ganhar nada na noite da premiação, e nem merece, ainda que seja um bom filme.

    The Post é um filme interessante sobre a importância da mídia nos bastidores do poder e merece ser visto por quem se interessa por entender como nossa visão sobre a política é formada.

    Nota: 7

    28 de fevereiro de 2018

    Trama Fantasma

    Costurado na medida

    Phantom Thread, Dir: Paul Thomas Anderson, EUA, 2017, 2h10min
    IMDB                 Trailer


    Sabe aquela velha história da moça pobre que encontra um homem rico e experiente que irá fazê-la feliz? Em Trama Fantasma é isso o que temos, mas de maneira muito, mas muito diferente.

    Na trama, um estilista ultrarrenomado conhece uma garçonete que se torna sua musa e amante. E suas relações se revelaram absurdamente estranhas, desde o primeiro encontro.

    Daniel Day-Lewis, talvez o maior ator de cinema de todos os tempos (e único a levar 3 prêmios na categoria principal do Oscar), ganhou de presente um personagem formidável na sua anunciada despedida das telas. Ele é antissocial, imaturo, metódico, irritadiço e tem complexo de Édipo. 

    O roteiro é formidável, cheio de momentos inesperados, reviravoltas e subtextos. Os problemas psicológicos não são exclusivos do excêntrico protagonista, se espalhando por todos os lados. Todas as personagens são complexas, ainda que a princípio parecessem ser meros estereótipos. Isso, aliás, é marca dos filmes do diretor e roteirista Paul Thomas Anderson, um dos maiores cineastas da atualidade. 

    O filme é de um sutileza incrível. Mais do que é dito, o que vale são as pequenas expressões faciais, as contradições e os desajustes. E para isso o diretor se vale de muitos closes em detalhes, mostrando a importância da imagem para se contar uma história nas telas. E, apesar do tema não fazer parecer, o filme é repleto de humor. Nada do tipo espalhafatoso ou anedótico, mas tudo causado pela inadequação de situações para uma pessoa metódica. 

    Além de Daniel Day-Lewis, o filme tem outras duas personagens fortes interpretando a irmã e a musa do protagonista. Ambas as atrizes, respectivamente Leslie Manville e Vicky Krieps, estão muito bem. A primeira recebeu indicação ao prêmio de coadjuvante, mas a segunda mereceria ainda mais, especialmente por fazer o contraponto preciso frente ao personagem principal e não se intimidar com a presença de um mito do cinema dividindo a cena com ela.  

    Tecnicamente o filme é excelente. As cores sóbrias dos cenários e das roupas casam perfeitamente com o ambiente. E a parte sonora é uma aula sobre a importância da trilha sonora e dos efeitos sonoros em um filme. Em alguns momentos é o som que conta a história.

    Além das indicações ao Oscar nas categorias de ator principal e atriz coadjuvante, o filme ainda disputa os prêmios de melhor filme, direção, trilha sonora e figurino. É favorito absoluto nessa última e dificilmente ganha outro prêmio, mas teria méritos para ganhar em todas.

    Trama Fantasma é um filme sensacional. Sutil e complexo sem criar dificuldades para o espectador acompanhá-lo. Uma aula de como fazer cinema de qualidade.

    Nota: 9

    27 de fevereiro de 2018

    A Forma da Água

    Amor embaixo d´água

    The Shape of Water, Dir: Guillermo del Toro, EUA, 2017, 2h03min
    IMDB                 Trailer 


    Sua vidinha cotidiana anda monótona e sem graça? Precisando de alguém que mude sua maneira de viver? E se esse alguém for beeeem diferente? Essa é a premissa de A Forma da Água.

    Na trama, uma mulher muda que trabalha como faxineira em um laboratório secreto dos EUA dos anos 60 se afeiçoa por um "homem-peixe" encontrado nas águas amazônicas e testado para seu potencial como arma na Guerra Fria contra os soviéticos.

    É um trama fantasiosa? Lógico. Então a primeira coisa a se fazer ao ir ao cinema não é ficar dizendo: "mas isso não pode acontecer!" É claro que não. O filme é simplesmente uma alegoria tentando mostrar que a beleza interior pode ser bem maior do que uma aparência horrenda. E não custa lembrar, o cinema acabou ganhando muito realismo no decorrer de seus anos, mas a fantasia foi e ainda é um dos seus elementos mais marcantes. Basta lembrar que um dos primeiros filmes da Sétima Arte foi Viagem à Lua, do visionário George Méliès, em que um canhão atirava uma bala que caía no satélite terrestre onde viviam seres exóticos.

    O tom do filme e sua protagonista guardam muitas semelhanças com O Fabuloso Destino de Amélie Poulain. Apesar do tom quase infantil que tem as histórias, suas tramas envolvem sexo, violência e conflito social. Em ambos a protagonista é uma mulher doce, sonhadora, tímida e reclusa. 

    A produção é caprichada. Os cenários são muito bonitos, com um que de retrô-futurístico, o futuro do pretérito, mostrando como seria o futuro na visão dos anos 60 (algo tipo o desenho dos Jetsons). Para se ambientar ao universo retratado a fotografia faz muito uso de tons de azul e verde, cores aquáticas. 

    O roteiro, porém, é bem simples. Uma historinha de amor improvável em que os amantes devem enfrentar grandes desafios, dentre eles o cenário real de paranoia da Guerra Fria, para ficarem unidos. Seus personagens são chapados E isso faz com que o espectador não se envolva emocionalmente com a história. Apenas verá uma historinha da carochinha bem contada e nada marcante.

    O diretor Guillermo del Toro é favorito ao Oscar. Sem dúvida, a parte técnica deve muito a seu trabalho e ele conduz bem seu elenco. Contudo, a mencionada falta de envolvimento do espectador com a história deixa a desejar.

    Sally Hawkings está encantadora como a protagonista muda e tímida. Digna de elogios também é a atuação indicada ao Oscar de Richard Jenkins, no papel de melhor amigo inseguro da protagonista. Não é o caso nem nunca deveria ter sido o da indicação da já (indevidamente) oscarizada Octavia Spencer, que sempre repete o mesmo papel de mulher do povo faladora. Michael Shannon é um bom ator e sua presença enche a cena, mas aqui parece ter atuado em modo automático.

    O filme é o líder de indicações ao Oscar disputando 13 categorias: filme, direção, roteiro original, atriz principal, atriz coadjuvante, ator coadjuvante, fotografia, edição, design de produção, trilha sonora, figurino, edição de som e mixagem de som. É fortíssimo candidato a levar o prêmio de melhor filme e favorito em direção, design de produção e trilha sonora. Assim tem sérias chances de ser o filme mais premiado da noite.

    A Forma da Água se destaca por seu belo visual e por seu tema fantástico. Infelizmente, seu roteiro deixa a desejar com a falta de profundidade e de imersão emocional em seu universo aquático.

    Nota: 6

    23 de fevereiro de 2018

    Lady Bird

    Sou doidinha mas me dei bem

    Dir: Greta Gerwig, EUA, 2017, 1h34min
    IMDB                 Trailer 


    A adolescência, especialmente em seu fim, é o momento em que nos preparamos para a vida de adulto que se seguirá. Nessa fase temos ainda muitos sonhos e achamos que somos capazes de tudo. Mas o nosso leque de opções, ainda que nos esforcemos a acreditar ser infinito, já se reduziu por conta de escolhas do passado. Aí começam nossas dúvidas sobre nosso potencial. Esse é o ponto de partida de Lady Bird.

    Na trama, Christine, autonomeada Lady Bird, uma adolescente no último ano do ensino médio, sonha em deixar a cidade de Sacramento na Califórnia e rumar para uma vida mais intelectualizada em alguma universidade tradicional na Costa Leste dos EUA. Mas seu desempenho escolar mediano faz com que todos desconfiem de sua capacidade de conquistar seu sonho.

    O roteiro e a direção são da descolada atriz Greta Gerwig, uma celebridade no mundo do cinema independente americano. Apesar de negar que o filme seja necessariamente uma autobiografia, a personagem-título tem quase que exatamente a mesma trajetória da diretora: é loira, de Sacramento, tem mãe enfermeira, pai da área de TI e sonhava em ter uma vida menos ordinária.

    Um dos temas mais fortes no filme é a relação entre Lady Bird e sua mãe. A mãe se sente frustrada por ter que trabalhar muito e ganhar pouco, e sonha que sua filha possa ter uma vida melhor que a dela. Já a filha sonha em ter um bom padrão de vida mas parece não querer acreditar que isso tem seu custo, e portanto vive em busca de pequenas alegrias.

    Nisso Lady Bird se parece bastante com Frances Ha, filme estrelado pela agora diretora Greta Gerwig, em que ela vive uma mulher já chegando aos 30 que se comporta como uma adolescente despreocupada. Lady Bird, assim, seria Frances Ha alguns anos mais jovem.

    O filme tem uma falta de foco que se casa com a personalidade da protagonista. Cada hora sua preocupação é diferente, cada hora se envolve com uma pessoa diferente e não percebe a importância das metas e relações duradouras. Tudo é muito fugaz para Lady Bird. Mas por mais que essa adequação entre falta de foco do filme e da personagem seja interessante, o roteiro se fragiliza pela falta da escolha de um ponto principal.

    Lady Bird tem alguns bons momentos. Mas são poucos e parece que quase todos os seus diálogos espertinhos foram mostrados no trailer. No fim, tem-se a impressão de que a obra foi feita para exaltar a trajetória de sua diretora, uma menina meio perdida que acabou dando certo nas artes, vendendo uma esperança de que basta acreditar nos seus sonhos que tudo dará certo.

    Destacam-se as atuações de Saoirse Ronan como a protagonista e de Laurie Metcalf como sua mãe ambas indicadas ao Oscar. Além das atrizes o filme conta ainda com mais 3 indicações: melhor filme, direção e roteiro original. Nesta última tem até uma chance considerável (embora não merecida) e dificilmente leva nas outras.

    Lady Bird é um filme apenas ok sobre a adolescência, que parece ter sido feito para massagear o ego da diretora que quer manter a pinta de descolada. 

    Nota: 6

    22 de fevereiro de 2018

    Me Chame pelo Seu Nome

    Amor Além do Verão 

    Call Me by Your Name, Dir: Luca Guadagnino, Itália/França/Brasil/EUA, 2017, 2h12min
    IMDB                 Trailer         


    A adolescência é um momento naturalmente complicado, em que começamos a adentrar no mundo dos adultos. E certamente essa fase seria mais complicada há 35 anos e se o interesse sexual se revelasse por pessoas do mesmo sexo. É daí que parte Me Chame pelo seu Nome.

    Na trama passada em "algum lugar no norte da Itália no verão de 1983", um professor de arqueologia recebe em sua casa por algumas semanas um assistente para sua pesquisa Oliver, um homem maduro, mas ainda jovem, seguro, bonito e atlético irá mexer com o filho do professor, Elio.

    O filme mostra a aproximação entre duas pessoas do mesmo sexo por meio de gestos sutis, às vezes quase imperceptíveis. Nesse aspecto lembra Carol, que nesse aspecto da aproximação é muito superior. Aqui, a ligação entre eles é muito mais do que meramente por interesse sexual, pois apesar das diferenças de experiência de vida de ambos, eles tem muitos interesses em comum, formando uma ligação quase que transcedental.

    Como o protagonista é adolescente, sua insegurança estará sempre presente. E ele viverá muitos momentos bobos típicos desta fase, como masturbação com fantasias estranhas, desabrochar sexual (no caso, tanto com o sexo oposto quanto com o próprio sexo), necessidade de auto-afirmar-se, dentre outras questões. Além disso, ele ficará dividido entre sua atração por Oliver e a atração de sua amiga Marzia por ele.

    A dupla de atores principais, Timothée Chalamet e Armie Hammer é digna de elogios e ambos foram devidamente agraciados com as indicações ao Oscar por atuação. Ambos tem atuações sutis e verdadeiras. 

    O filme, apesar de ser principalmente falado em inglês americano, tem muito mais ritmo de filme europeu. Aliás, seu ritmo se casa muito bem o de seu cenário, de um verão longo e preguiçoso em uma área semi-rural na Itália.

    Por conta disso, não há de se esperar reviravoltas e muitos acontecimentos ao longo de sua projeção. Tudo será calmo e sutil. Até demais. Leva-se muito tempo na construção dos personagens e na apreciação dos cenários, sem nada de muito relevante. Mesmo os mais acostumados a um cinema de ritmo mais lento podem se incomodar com a falta de ação no filme. Felizmente, em seu final (especialmente no monólogo do pai de Elio), o filme nos remete ao sentido de tudo que ocorreu e talvez não tenhamos notado.

    Recebeu 4 indicações ao Oscar: melhor filme, ator principal, ator coadjuvante e roteiro adaptado. É o favorito nesta última categoria e praticamente não tem chances de ser premiados nas outras.

    Me Chame pelo Seu Nome é um filme sutil, delicado e lento. Uma obra que nos faz pensar nas pequenas coisas que nos aproximam dos outros e no quão raro é uma conexão profunda entre duas pessoas.

    Nota: 7

    16 de fevereiro de 2018

    Três Anúncios para um Crime

    Um Ensaio sobre o Ódio 

    Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, Dir: Martin McDonagh, EUA, Reino Unido, 2017, 1h55min
    IMDB                 Trailer


    Se as autoridades são incompetentes, é correto provocá-las? Essa é uma das principais perguntas levantada em Três Anúncios para um Crime.

    Na trama, uma mulher que teve a filha adolescente estuprada e assassinada resolve provocar as autoridades policiais de sua pequena cidade ao colocar três anúncios em outdoors questionando sua ineficácia em encontrar os culpados após vários meses da ocorrência do crime chocante. Essa atitude irá em colocar em rota de colisão com diversas pessoas, incluindo até mesmo sua família.

    O filme nos leva à chamada América Profunda, em um cidadezinha na região central dos EUA e de relevância quase nenhuma à opinião pública do país, sempre ligada ao noticiário dos grandes centros urbanos.

    Sua protagonista é uma mulher comum, da classe trabalhadora, que passa a imagem de anti-heroína, pois por mais que se queira gostar dela é impossível concordar com toda sua brutalidade e seu desejo de fazer as coisas certas ao seu modo truculento. E nos leva ao questionamento se o ódio, ainda que surgido de uma grande injustiça, tem algum valor na resolução dos problemas.

    Lendo a sinopse não é possível se imaginar que o filme possa ser bem humorado. Mas é. Um humor às vezes áspero, às vezes pastelão, sempre bem inserido, que impressionantemente dá um senso maior de realismo ao filme, pois na vida os dramas vem acompanhando de atitudes atrapalhadas. O humor também consegue tornar o filme mais fácil de ser assistido, pois os temas tratados serão muito pesados, abordando ódio, vingança, culpa, compaixão, solidariedade, racismo, sexismo, dentre outros.

    O bom roteiro assinado pelo diretor do longa Martin McDonagh reserva muitas surpresas sobre o passado e sobre os personagens e a trama terá reviravoltas. Sua direção também é discreta, dando espaço para o destaque do ótimo elenco.

    Frances McDormand vai certamente e merecidamente levar o Oscar. Sua atuação permite que cada um julgue como quiser a personagem, pois ela não cai em maniqueísmo de ser heroína ou de ser vilã, nem mesmo deixa que qualquer característica marcante de sua personagem, como a dureza, a tornem uma personagem bidimensional.

    Sam Rockwell também levará a sua estatueta como coadjuvante e tem os mesmos créditos da protagonista. Se no princípio seu personagem é burro e repugnante, no último ato ele passa por uma grande transformação.

    Além dos citados prêmios de atriz principal e ator coadjuvante, o filme também está indicado a melhor filme, roteiro original, trilha sonora, edição e novamente em ator coadjuvante com Woody Harrelson. Como mencionado, é certo que será premiado nas categorias de atuação, é um dos favoritos a levar melhor filme, e pode surpreender em roteiro, mas nas demais categorias suas chances são remotas.

    Três Anúncios para um Crime é um filme muito bom sobre vingança e justiça. Um filme que é amaciado pelo humor na medida certa, sem perder sua seriedade. E um sério candidato a levar o Oscar de melhor filme.

    Nota: 8

    2 de fevereiro de 2018

    O Destino de uma Nação

    O Discurso do Rei... Primeiro Ministro 

    Darkest Hour, Dir: Joe Wright, Reino Unido/EUA, 2018, 2h05min
    IMDB                 Trailer


    Em quase todo o ano há um filme britânico na lista de melhores filmes do Oscar. Isso levou à criação do termo jocoso "cota britânica" na premiação hollywoodiana. Neste ano, na linha típica de filmes de época do Reino Unido tratando de personalidades reais, temos O Destino de Uma Nação.

    A trama acompanha o primeiro mês após o ataque alemão às forças aliadas na Batalha da França da Segunda Guerra Mundial, um dos momentos mais cruciais na história britânica e que levou o velho político Winston Churchill a assumir o cargo de primeiro ministro. O foco do filme fica na parte política e na luta de Churchill para derrotar os importantes políticos que defendiam um acordo de paz com a Alemanha de Hitler, sobretudo seu antecessor, Neville Chamberlain.

    O filme se passa quase que inteiramente em ambientes internos e em meio à discussões políticas. Quem não se interessa pelo assunto, certamente não irá gostar. Também aborda bastante a excêntrica personalidade de Churchill, um homem de maneiras exageradas e de alma passional, bem diferente do padrão comedido pelo qual os ingleses são conhecidos.

    O destaque do filme é a atuação de Gary Oldman como protagonista. Seria muita fácil cair numa representação caricatural de um homem tão excêntrico, mas Oldman sabe dosar os episódios de arroubos do político com os momentos mais introspectivos do homem de família. Além disso, a maquiagem também é um primor, tornando Oldman quase irreconhecível. 

    Fora essas qualidades, o filme é apenas correto. Nada é mal feito, como é comum em produções britânicas: as atuações são boas, o roteiro funciona e a direção é caprichada. Mas nada aí é digno de destaque também. 

    Quanto ao roteiro, apesar de acertar ao criar um Churchill complexo em vez de simplesmente criar um herói irretocável ou um homem bizarro que deu certo, erra na sua extensão (o que poderia também ser consertado na edição), pois daria daria para enxugar ao menos uns 20 minutos do filme sem prejuízo à narrativa, já que muitas vezes às discussões se parecem com o repeteco do que já havia sido dito anteriormente com Churchill sempre enfatizando a necessidade de não ter apaziguamento com Hitler. Às vezes parece que o roteiro só vai criando elementos para Churchill proferir seu famoso discurso em que disse que os britânicos lutariam em todos os locais mas que jamais se renderiam, lembrando assim o mediano vencedor do Oscar O Discurso do Rei

    O filme é uma obra de ficção baseada em realidade, o que leva a ter alguns fatos bem fantasiosos criados na narrativa, como Churchill tomar o metrô e querer saber a opinião do povo sobre a atitude a tomar com relação à Hitler. É exagerado mas é bem feito, ao contrário de outro filme recente da cota britânica, O Jogo da Imitação, que exagera no melodrama numa tentativa patética de dar emoção ao filme.

    Tecnicamente, o filme se destaca pelos cenários bem compostos, pelo realismo da fotografia e pelo grande número de figurantes que torna os ambientes mais humanos, especialmente do tumultuado plenário da Câmara dos Comuns. Mas fica devendo por não fazer bem suas poucas sequências externas, marcadamente usando planos fechados e computação gráfica.

    Na corrida do Oscar o filme tem 6 indicações: melhor filme, ator, fotografia, design de produção,  maquiagem e figurino. É praticamente certo que leva os prêmios de ator e de maquiagem e dificilmente ganha algum outro. Mas como a votação do Oscar de melhor filme tem um sistema complexo de lista de preferência, pode acontecer de bater os favoritos Três Anúncios para um Crime e A Forma da Água

    O Destino de Uma Nação é um filme feito sob medida para dar o Oscar a Gary Oldman. Ao espectador que gosta de história e política, adicionará um pouco de conhecimento sobre a figura de Churchill, para muitos o maior político do século XX. Como cinema, poderia ter caprichado um pouco mais e cortado alguns minutos para não tornar a a obra cansativa.

    Nota: 6

    21 de dezembro de 2017

    Star Wars: Os Últimos Jedi

    Mickey Skywalker 

    Star Wars: The Last Jedi, Dir: Rian Johnson, EUA, 2017, 2h32min
    IMDB 


    Star Wars retornou às telas de forma brilhante em O Despertar da Força. Uma nova geração de personagens foi apresentada sem descuidar do respeito aos heróis clássicos, muitos mistérios foram introduzidos e cenas belíssimas foram apresentadas. Seu sucesso entre o público e a crítica foram extraordinários. E agora vem sua continuação, Os Últimos Jedi.

    Na trama, a Primeira Ordem de Snoke e Kylo Ren persegue os últimos remanescentes da Resistência liderados pela General Leia e pelo intrépido Poe Dameron, enquanto a jovem Rey irá iniciar seu treinamento Jedi com o lendário Mestre Luke Skywalker e tentará convencê-lo a se unir aos rebeldes no conflito galático.

    A primeira coisa a se destacar no filme é sua estrutura bem diferente dos anteriores. Para o bem, e para o mal. Se por um lado optou-se, como em Rogue One, por adotar um tom mais realista, em que heróis e vilões são apenas duas faces da mesma moeda que podem facilmente transitar de um lado para outro e em mostrar personagens comuns na galáxia, por outro lado buscou-se dar uma leveza no filme com muitas cenas engraçadinhas à la filmes da Marvel, coirmã da Lucasfilm. Algumas são divertidas, outras são desnecessárias e parte delas quebram de maneira tosca um momento solene.

    O roteiro tem bastante coisa interessante, especialmente na interação entre os personagens, e quebra várias expectativas, mas tem falhas em alguns desenvolvimentos de tramas menores. E a edição não ajuda. Nem um pouco. 

    O filme é o mais longo da saga (2h32min) e dá muito espaço para sequências sem grande interesse, como todo o arco do Finn, e tem cortes muito apressados na muito mais interessante interação entre Luke e Rey. Lembra assim O Retorno de Jedi, o pior filme da sequência original, que se alonga mais contando a historinhas dos ewoks do que no confronto final entre Vader e Luke, mostrada em ritmo de videoclipe. Em alguns momentos há também uma quase falta de continuidade, de se perguntar como tal personagem foi parar em tal local.

    Os personagens principais do filme anterior estão em destaque, especialmente Poe e Finn. Contudo, seu desenvolvimento é bem pobre. Eles têm muito tempo em tela mas menor importância que na aventura anterior. O destaque entre os personagens fica com os gêmeos Luke e Leia, aqui mais bem aproveitados do que em qualquer filme da saga. Rey e Kylo tem um arco interessante, mas faltou a camada de mistérios que os deixava enigmáticos em O Despertar da Força. Aqui há até sequências um tanto sobrenaturais, mas nada tão provocador quanto o sonho (ou pesadelo) de Rey no primeiro filme. Os novos personagens são completamente desnecessários e mal desenvolvidos.

    Ao contrário do que se esperava, este filme adota um tom muito mais leve que seu antecessor (ainda que tenha sequências bem pesadas). Talvez seja um indício de que a Disney quer padronizar seus filmes para acertar em formas seguras para atrair o maior público possível, vender mais bonecos, criar mais áreas temáticas em seus parques e obter lucros astronômicos. Claro que Star Wars é um produto e o lucro é a parte mais importante no negócio, mas poderiam pegar mais leve nessa parte comercial.

    Apesar desses vários problemas o filme tem ótimas partes. Há cenas com forte apelo nostálgico, até servindo de motivo de piada metalinguística. Ainda que sejam um truque barato, funcionam. Há cenas de muita beleza, tanto visual quanto emocional. E os minutos finais deixam até mesmo os mais críticos arrepiados.

    Star Wars: Os Últimos Jedi é um filme diferente da saga, em que o tom solene foi deixado de lado em prol do entretenimento fácil, com uma edição que errou em não dar destaque a seus pontos mais fortes. Ainda assim, há sequências memoráveis e um desenvolvimento de trama surpreendente com um final arrebatador.

    Nota: 7


    P.S: Normalmente não leio críticas antes de postar o meu pitaco. Dessa vez li algumas e vou deixar aqui destacadas as que mais gostei, uma negativa, da Juliana Varella do blog Fala, Cinéfilo!, e outra positiva, do Tiago Belotti do canal Meus 2 Centavos.

    23 de novembro de 2017

    Corra!

    Bem Vindo. Só que não.

    Get Out, Dir: Jordan Peele, EUA, 2017, 1h44min
    IMDB                 Trailer 


    Sabe como é aquele primeiro encontro com os sogros? Um certo constrangimento, você se sentindo examinado a todo momento e tentando não fazer feio? Pois é. Em Corra! o protagonista também se vê nessa situação, mas terá desafios bem maiores que esses.

    Na trama, Chris, um jovem fotógrafo vai passar o final de semana na casa dos pais de sua namorada. Desde o início fica tenso pelo fato de ser um negro sendo introduzido num núcleo familiar de brancos ricos. Para piorar, no segundo dia de visita haverá um evento social no local em que só irão comparecer mais brancos ricos.

    O filme trata de maneira sutil e inteligente o racismo nos EUA. Sutil não por ser de leve, pois a questão racial está sempre presente, mas por não ter escolhido o caminho fácil de levar o protagonista para uma comunidade caipira seguidora do Ku Klux Klan no interior do Mississipi. Ao contrário, leva o protagonista para um ambiente de pessoas esclarecidas, tolerantes, progressistas e que votariam no Obama pela terceira vez se pudessem. Lembra o discurso de Chris Rock no Oscar 2016 (o famoso #OscarSoWhite), em que ele diz que convive com os brancos mais legais que existem, mas mesmo assim ainda é tratado de maneira diferente nesse meio.

    As diferenças de tratamento são curiosas. Aqui, em uma versão de racismo 2.0, os brancos não conversam com Chris tratando-o como inferior, mas tentando fazer elogios sobre suas qualidades, o que é uma forma sutil de dizer que ele é um inferior com alguns atributos positivos.  Assim, elogiam seu físico, perguntam sobre seu desempenho sexual, etc, demonstrando um imensa dificuldade em tratá-lo naquele ambiente simplesmente como mais um convidado, e não como um alienígena.

    O tom do filme é de contante perturbação e confusão. Sabe-se que por trás das boas maneiras dos brancos e no comportamento anormal dos negros do local que há segredos importantes escondidos, mas não se sabe o quê. O diretor nos coloca no mesmo ponto de Chris, que está perplexo, sem entender o que é aquele ambiente tão estranho em que se encontra. 

    O filme foi distribuído como uma produção do gênero terror. Há, de fato, alguns elementos do gênero, mas ele está mais bem encaixado na caixa do suspense. Segundo o diretor, seria um thriller racial. E no prêmio mais sem seriedade do cinema, o Globo de Ouro, o filme recebeu a classificação de comédia! Até tem umas boas piadas na trama, mas classificá-lo como comédia, com o perdão da ironia, é uma piada.

    O roteiro e a direção, ambas do humorista Jordan Peele, são perfeitas, especialmente considerando que este é seu primeiro trabalho na condução de um filme. Até mesmo os diálogos que parecem ser simples troca de amenidades revelam algo há mais. Há muitas entrelinhas em todas as frases e as informações sobre o que se esconde vão sendo dadas aos poucos, mas mesmo assim será impossível ao expectador ter ideia do que será revelado ao final.

    Os personagens principais apresentam bastante complexidade, pois todos revelam algo na superfície mas são bem diversos na realidade. Os atores podem não ser brilhantes ou conhecidos, mas todos estão perfeitamente escalados para seus papéis e muito bem dirigidos, com pequenos gestos que dão pistas sobre suas intenções, destacando-se o intenso trabalho do protagonista vivido pelo inglês Daniel Kaluuya.

    A fotografia do pouco conhecido Toby Oliver não necessita de cenários complexos para criar uma história visualmente surpreendente, fazendo boa alternância de planos abertos e fechados e de movimentos de câmera para deixar o espectador querendo ver mais do que está sendo mostrado, dando um senso de prisão. Também há que se destacar as claras referências ao gênio Stanley Kubrick, além do tom do filme lembrar muito ao de O Iluminado, também há enquadramentos que fazem clara menção à conhecida perspectiva ponto de fuga (clique aqui para ver) do maior diretor de todos os tempos.

    A edição é ótima, o filme se passa devagar, mas nunca deixa o espectador relaxado, e sabe o momento ideal de revelar seus segredos assim como utiliza do tempo necessário para seu desfecho, e faz tudo isso em menos de duas horas, coisa que todos os cineastas deveriam fazer nesse cenário atual de filmes de duas horas e meia.

    Nas especulações para o Oscar 2018 o filme tem aparecido em diversas listas como melhor filme. Não é indicação certa, especialmente por ser um filme bem pouco convencional e por misturar terror, suspense e comédia, gêneros que dificilmente figuram na lista final de melhores filmes. Ainda assim está no topo da lista do site Rotten Tomatoes como o filme com maior número de avaliações positivas pela crítica. Se o estúdio fizer bem o lobby pode conseguir estar na lista de melhores filmes, assim como receber indicação a melhor roteiro e melhor edição. As chances são pequenas para melhor direção assim como para seu ator principal. Nessa semana saiu a lista de indicados no Spirits Award (a premiação do cinema independente) e o filme recebeu indicação em todas essas categorias.

    Corra! é uma pequena obra-prima, com destaque para seu surpreendente roteiro e sua competente edição. E uma prova de que se os negros de Hollywood tiverem mais chances na indústria (e não as sugeridas categorias próprias em premiações) podem apresentar trabalho fantásticos. 

    Nota: 10

    7 de novembro de 2017

    Thor: Ragnarok

    Batalha dos Deuses

    Dir: Taika Waititi, EUA, 2017, 2h10min
    IMDB                 Trailer 


    Thor, O Deus do Trovão, já teve duas aventuras solo no Universo Cinematográfico Marvel. Thor foi um filme de origem no máximo razoável. Sua continuação, Thor: O Mundo Sombrio, é um dos piores filmes da Marvel. Dessa vez, resolveram mudar completamente o tom sombrio e épico dos filmes anteriores em Thor: Ragnarok e acertaram em cheio ao torná-lo uma comédia de aventura sci-fi.

    No filme, Thor é confrontado por uma vilã mais poderosa que ele, a Deusa da Morte Hela, e tem de impedir que ela destrua tudo por meio de sua versão particular do apocalipse, o Ragnarok. E no caminho encontra seu parceiro Hulk em um planeta que é um mix de Roma Antiga com Las Vegas e uns toques da Los Angeles decadente de Blade Runner. E isso não significa ser um filme sem comprometimento com seu universo cinematográfico, pois seus eventos serão fundamentais para a continuidade da série (a tradicional cena pós-créditos é obrigatória).

    O filme adota um tom de aventuras divertidas dos anos 80, muito em voga hoje na esteria do sucesso de Stranger Things. Há toques de filmes da série Indiana Jones, já que o protagonista tem uma missão importante, mas sempre se envolve em confusões. Também há o visual futurista intergalátcio daquele período com armas de raio laser que remete a filmes pseudo-trash, como Flash Gordon e o lamentável Mestres do Universo. Certas piadas vão divertir muito os moleques de 12 anos, incluindo os que habitam dentro dos homens de mais de 30.

    Sua produção é caprichada, como é praxe no universo da Marvel. Destaque para a trilha sonora fortemente influenciada pelo tecno pop dos anos oitenta, com batidas eletrônicas e excessos de sintetizadores, além das cenas de lutas em que toca o clássico Immigrant Song do Led Zeppelin, já tocada no teaser trailer. Os efeitos visuais também seguem o padrão de qualidade do estúdio e uma indicação ao Oscar nessa categoria é possível.

    As atuações são boas. Chris HemsworthTom Hiddleston e Mark Ruffalo estão bem à vontade retomando seus papéis. O ótimo Idris Elba ganhou mais espaço aqui por conta de sua ascendente reputação. O canastrão Jeff Goldblum funciona muito bem como alívio cômico. E tem a fenomenal Cate Blanchett.

    Thor: Ragnarok é um bom filme no qual todos os elementos se voltam exclusivamente para um fim: divertir e entreter seu público.

    Nota: 7

    26 de outubro de 2017

    Blade Runner 2049

    Admirável Mundo Retomado 

    Dir: Denis Villeneuve, EUA, 2017, 2h44min
    IMDB                 Trailer



    Blade Runner foi uma filme revolucionário lançado em 1982. Apesar dos produtores terem criado uma edição cheia de bobeiras, como narrações em off (ou voice over), retirada de violência gráfica e um final "feliz", ainda assim chamou a atenção. Quando esses erros foram corrigidos na versão do diretor em 1992 o filme passou a ser considerado uma obra-prima pela crítica. A história passada em uma Los Angeles futurista distópica no então longínquo 2019 mostrava um mundo de grande avanço tecnológico e de retrocesso ambiental e social, em que humanos criados em laboratório, os replicantes, faziam os trabalhos indesejados, e caso saíssem da linha, eram caçados pelos blade runners. Blade Runner 2049, como indica o texto, irá contar uma história 30 anos à frente da original.

    Como disse o diretor, o filme pode ser visto por quem não viu o original. Mas é fortemente recomendado ver o primeiro filme por dois motivos: é um obra-prima e vai ajudar muito na compreensão desse.

    Na trama, o blade runner replicante K, após uma missão de "retirada" de outro replicante, descobre um grande mistério do passado envolvendo os replicantes e cuja revelação iria abalar profundamente as bases da sociedade. Como de costume em filmes de Denis Villeneuve, não darei maiores detalhes sobre a trama que vai se revelando aos poucos.

    Aliás, é bom frisar esse ponto de "aos poucos". Para àqueles acostumados ao cinema de aventura atual, com ritmo alucinante, Blade Runner 2049 pode soar como um sonífero. Mas, novamente, isso é para quem está mal acostumado. O filme desenvolve-se lentamente, com um roteiro bem construído, mas está longe de ser enfadonho. Um toque de cinema de arte em um filme comercial, algo que poucos diretores são capazes de fazer e que poucos estúdios estão dispostos a bancar.

    A trama retoma o questionamento sobre o que faz de uma pessoa algo diferenciado de outros seres. Se antes a análise era entre uma pessoa e um replicante, agora, que o replicante já passou a ser visto como pessoa, tenta se analisar se figuras digitais também são humanos. Dessa forma, há alguns ecos do excelente Ela. O filme, como o original, trata de temas religiosos, filosóficos, psicanalíticos e metafísicos. Não é nenhum tratado de nenhuma dessas coisas, mas, se tratando de cinema comercial, é um grande feito incluir tais assuntos. Também há fortes críticas sociais ao nosso estilo de vida, como o fato de usarmos produtos produzidos por mão de obra explorada que sabemos que existe mas que preferimos ignorar e ao consumo desenfreado, que em nada elevam a qualidade de vida.

    Os atores estão todos bem. Ryan Gosling, muitas vezes criticado por parecer um robô, aqui é de fato um "robô" (muitas e muitas aspas aqui)! O que os que fazem tais críticas talvez não percebam sua sutileza ao interpretar personagens muito introspectivos, como ele fez em Drive. Ele controla bastante suas expressões, mas tem um olhar discreto que demonstra bem seu estado de espírito. Harrison Ford consegue dar sequência ao seu personagem Deckard, mostrando que os anos que se passaram lhe foram muito difíceis. Jared Leto está bem em seu papel de magnata megalomaníaco cruel e sofisticado criador dos replicantes mas tem pouco tempo em cena. A surpresa positiva fica com as belas mulheres em papéis coadjuvantes. Ana de Armas interpreta um sistema operacional visível por meio de projeção holográfica que parece mais real do que muitos personagens físicos. E a replicante interpretada por Sylvia Hoeks tem uma maldosa presença marcante.

    A parte técnica é toda bem executada. A trilha sonora de Hans Zimmer é boa, mas não se compara a outros de seus trabalhos marcantes, como Batman: O Cavaleiro das Trevas e Dunkirk e muito menos à marcante trilha do filme original de Vangelis. A fotografia bem esfumaçada, sombria e com muito uso de cores vivas de Roger Deakins é ótima, mas faltou o impacto que a originalidade do primeiro filme oferecia. Aqui há maior presença de cenas diurnas, ao contrário do quase que exclusivamente noturno filme original. A edição apresenta o filme lentamente, permitindo ao espectador ir absorvendo completamente todas as informações passadas muitas vezes somente de maneira visual.

    A impressão que fica é que os principais envolvidos como Villeneuve, Deakins e Zimmer ficaram presos demais ao filme original, faltando um pouco de criatividade que eles poderiam ter adicionado. Isso de maneira alguma representa que eles tenham feito um mal trabalho, mas que eles já fizeram coisas melhor e poderiam aqui também ter feito.

    Na disputa do Oscar 2018 o filme deve receber indicações a melhor filme e melhor diretor e diversas indicações técnicas: trilha sonora, fotografia, efeitos visuais, design de produção, edição de som, mixagem de som e figurino. Pode, assim como Mad Max: Estrada da Fúria, ser o filme com maior número de prêmios ainda que não leve os prêmios mais nobres. Dificilmente terá seus atores indicados, mas pode ser que algum lobby forte tente dar uma indicação ao carismático Harrison Ford.

    Blade Runner 2049 é um ótimo filme que traz elementos do cinema de arte para um filme de apelo comercial. Poderia ter se desprendido um pouco mais do filme original, mas ainda assim oferece um produto de ótima qualidade.

    Nota: 8


    P.S: Recentemente fiz uma análise de todos os filmes mais comerciais de Denis Villeneuve. Clique nos títulos para ler sobre Incêndios, O Homem Duplicado, Os Suspeitos, Sicario e A Chegada.